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22 de outubro de 2010

Inferno



Inferno é a palavra usada na versão Almeida da Bíblia (bem como na versão católica Matos Soares e na maioria das traduções antigas), para traduzir o termo hebraico she’óhl e o grego haídes. Na versão Almeida, a palavra “inferno(s)” é traduzida 28 vezes de she’óhl e 7 vezes de haídes. Esta versão não é coerente, contudo, uma vez que she’óhl também é traduzido 27 vezes por “sepultura”, 5 vezes “sepulcro”, 1 vez “terra”, 1 vez “enterrados”, 1 vez “mundo invisível”, e 2 vezes é transliterado “Seol”. Na versão Matos Soares, o termo she’óhl é traduzido por “inferno(s)” 34 vezes, “habitação dos mortos” 11 vezes, “sepulcro” 11 vezes, “sepultura” 4 vezes, “abismo” 1 vez, “terra” 1 vez, “[perigos] exiciais” 1 vez, “morte” 1 vez, e é transliterado “cheol” 2 vezes.


Em 1885, com a publicação da completa English Revised Version (Versão Revisada Inglesa), a palavra original she’óhl foi, em muitos lugares, transliterada para o texto inglês das Escrituras Hebraicas, embora, na maioria das suas ocorrências, se usasse “sepultura” e “cova”, e “inferno” ocorre cerca de 14 vezes. Este foi um ponto em que a comissão americana (dos E.U.A.) discordou dos revisores ingleses, e, assim, ao produzirem a American Standard Version (Versão Padrão Americana, 1901), eles transliteraram she’óhl em todas as suas 65 ocorrências. Ambas as versões transliteraram haídes nas Escrituras Gregas Cristãs em todas as suas dez ocorrências, embora a palavra grega Géenna (português: “Geena”) seja traduzida por “inferno” em todas as ocorrências, como acontece em muitas outras traduções modernas.
A respeito do uso de “inferno” para traduzir estas palavras originais do hebraico e do grego, o Dicionário Expositivo de Palavras do Velho e do Novo Testamento, de Vine, (1981, Vol. 2, p. 187) diz: “HADES . . . Corresponde a ‘Seol’ no Antigo Testamento. Na Versão Autorizada do Antigo Testamento e do Novo Testamento, foi vertido de modo infeliz por ‘Inferno’.”
A Enciclopédia da Collier, (1986, Vol. 12, p. 28) diz a respeito de “Inferno”:


“Primeiro representa o hebraico Seol do Antigo Testamento, e o grego Hades, da
Septuaginta e do Novo Testamento. Visto que Seol, nos tempos do Antigo
Testamento, se referia simplesmente à habitação dos mortos e não sugeria
distinções morais, a palavra ‘inferno’, conforme entendida atualmente, não é uma
tradução feliz.”


É, de fato, devido ao modo como a palavra “inferno” é entendida atualmente que ela constitui uma maneira tão ‘infeliz’ de verter estas palavras bíblicas originais. O Terceiro Novo Dicionário Internacional de Webster, exaustivo, diz sob “Inferno”: “de . . . helan, esconder”. A palavra “inferno” não transmitia assim, originalmente, nenhuma idéia de calor ou de tormento, mas simplesmente de um ‘lugar coberto ou oculto’. No antigo dialeto inglês, a expressão “helling potatoes” (“infernizar batatas”) significava, não assá-las no fogo, mas simplesmente colocar as batatas no solo, ou num porão.
O significado atribuído à palavra “inferno” atualmente é o representado na Divina Comédia de Dante, e no Paraíso Perdido de Milton, significado este completamente alheio à definição original da palavra. A idéia dum “inferno” de tormento ardente, porém, remonta a uma época muito anterior a Dante ou a Milton. A Enciclopédia Universal Grolier, (1971, Vol. 9, p. 205), sob “Inferno”, diz: “Os hindus e os budistas consideram o inferno como lugar de purificação espiritual e de restauração final. A tradição islâmica o reputa um lugar de castigo eterno.” O conceito de sofrimento após a morte é encontrado entre os ensinos religiosos pagãos dos povos antigos da Babilônia e do Egito. As crenças dos babilônios e dos assírios retratavam o “mundo inferior . . . como lugar cheio de horrores, . . . presidido por deuses e demônios de grande força e ferocidade”. Embora os antigos textos religiosos egípcios não ensinem que a queima de qualquer vítima individual prosseguiria eternamente, eles deveras retratam o “Outro Mundo” como tendo “covas de fogo” para “os condenados”.


The Religion of Babylonia and Assyria (A Religião de Babilônia e Assíria), de Morris Jastrow Jr., 1898, p. 581; The Book of the Dead (O Livro dos Mortos), com apresentação de E. Wallis Budge, 1960, pp. 135, 144, 149, 151, 153, 161, 200.



Visto que o “inferno de fogo” tem sido um ensino básico da cristandade por muitos séculos, é compreensível por que a Enciclopédia Americana, (1956, Vol. XIV, p. 81) disse: “Muita confusão e muitos mal-entendidos foram causados pelo fato de os primitivos tradutores da Bíblia terem traduzido persistentemente o hebraico Seol e o grego Hades e Geena pela palavra inferno. A simples transliteração destas palavras por parte dos tradutores das edições revistas da Bíblia não bastou para eliminar apreciavelmente esta confusão e equívoco.”



Fontes: arquivos pessoais do autor.

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